terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Simuladores

Sinto-me num simulador. Como se fizesse parte de um daqueles estudos cegos, em que as pessoas são observadas ao pormenor a cada momento, sem nunca o saberem. Por vezes sinto que levo uma vida que não é a minha. Apesar de ser eu que a estou a viver. Apesar de ser eu que me levanto e preparo para ir trabalhar, venho a casa almoçar, volto para a escola e regresso a casa no final do dia. Nos fins-de-semana, sinto-me mais vivo. Sinto-me mais eu. Mais nós. Isso é bom! É mesmo muito bom!

Ainda assim, a indefinição relativamente ao que aí vem é tanta que me deixa sentimentos mistos: se por um lado saber que a mudança vai chegar me dá algum tempo para me preparar para ela, por outro, saber que essa mudança implica "fechar" definitivamente quinze anos de vida profissional dá-me alguma tristeza. Tristeza porque durante todo este tempo, eu que nem sequer acredito no Pai Natal, sempre fui tendo esperança de entrar para o quadro. Porque, devido ao gosto que tenho pela minha profissão fui tratando de fazer algumas formações, investi num mestrado, andei anos e anos com a casa às costas, longe de amigos e de família. Longe do conforto da casa dos pais. Longe dos abraços e das conversas e (progressivamente) mais longe das pessoas que comigo cresceram e ajudaram a crescer. A diferença é que comecei com vinte e dois anos. E aos vinte e dois anos aceita-se quase tudo, fazem-se sacrifícios em função das expectativas que o "sistema" nos cria e nos vai alimentando. Fica-se colocado com 18 horas, ou com 19h ou com 9h ou até com 6h mas continua-se a ir trabalhar. Nem que seja para trazer 320€ para casa no final do mês. Que nem o transporte pagam. Faz-se quase qualquer coisa por mais uns dias de serviço. Por mais um acrescento, por pequenino que seja, na média para o concurso. Corre-se o país de Norte a Sul. Do litoral ao interior. Conhece-se o país real. O mesmo país real de que alguns falam mas que só conhecem das reportagens dos serviços noticiosos a que assistem sentados nos seus gabinetes.

 O mesmo país real que sofre. Com a crise. E com os cortes a que, dizem,  "a crise obriga"; "não há dinheiro". "Que vivemos acima das nossas possibilidades". Quem? Eu? Fui eu que decidi construir auto-estradas, que ninguém usa, a empresas que ninguém sabe a quem pertencem, com contratos em que o Estado (que somos todos nós) se compromete a pagar por cada veículo que lá passar um valor X de euros e que se o número de veículos previsto não for atingido, o mesmo Estado compensa essas empresas? Fui que decidi nacionalizar o BPN porque os srs do bloco central tinham lá investido o seu dinheiro? Foram os reformados quem decidiu comprar submarinos e pagar comissões de milhões a meros intermediários, como aos escritórios de advogados?

É preciso cortar na despesa. Não há problema, tiram-se os subsídios aos trabalhadores. É preciso cortar mais na despesa: aumenta-se o IRS dos trabalhadores e aos pensionistas e reformados. Reduz-se o subsídio de desemprego em seis por cento. Corta-se nas indemnizações a pagar aos trabalhadores. Aplica-se uma sobretaxa de solidariedade a quem recebe pensões acima dos 1350€. Porque ara este Governo, quem recebe uma pensão de 1350€ depois de trinta ou quarenta anos de desconto, é rico. Não merece receber tanto. Não há dinheiro para a saúde. Não há dinheiro para a educação. Não há dinheiro para a justiça. Mas há mil e cem milhões de euros para injectar no BANIF um banco privado que vale pouco mais de metade desse valor.

As IPSS, o Banco Alimentar, todas as organizações que estão a resolver o problema de fome real que há no país têm cada vez mais dificuldades em ajudar a crescente população desempregada e empobrecida. Idosos retirados de lares pelas famílias, não porque tenham decidido tratá-los bem em casa por altruísmo, mas porque o velhote recebe um vale de pensão que ajuda a compôr o orçamento mensal. Pessoas que não vão ao hospital porque não têm dinheiro para pagar as taxas moderadoras, quanto mais os medicamentos na farmácia.

É urgente mudar de rumo. É necessário rever a matéria e mudar de método de estudo. Trabalhar mais e melhor. Tirar os olhos do resultado e colocá-lo no processo. Não será a primeira vez que aqui digo isto: Mais importante que o resultado é o processo. É o caminho que determina o sucesso da viagem. Continua o governo muito mais preocupado no resultado do défice e menos preocupado com o caminho a percorrer para o atingir. E assim, segue desvairado, a toda a velocidade na direcção errada. O choque é inevitável. Infelizmente. Para todos nós. Eles? Eles já têm os seus lugares assegurados para o pós-governação. Não tenham dúvidas.

Precisamos de gente séria e a sério!
E não deste simulacro de Governo.

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