quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A estrada

Às vezes, dou por mim a pensar no que escrevo. É triste. Prefiro escrever sem pensar e deixar que sejam os dedos a deslizar sobre as teclas, enquanto fico a olhar para o ecrã e vejo as palavras surgir. Como se fosse magia. Como se fosse um outro eu a escrever aquilo que não sei como dizer. Que não sei pôr em palavras.

Este ano tenho muito tempo para pensar, principalmente quando estou em viagem. E tenho estado em viagem todos os fins-de-semana. Como a maior parte delas faço apenas com a minha companhia, às vezes noto que o pensamento desliza. Sem itinerário definido. Sem percurso escolhido. Umas vezes vai para perto, outras para mais longe. Umas vezes foca-se em pessoas, outras em coisas. Dou por mim a contar os traços da estrada. Ou os sinais de trânsito. Também já contei os candeeiros da iluminação pública. Ou os carros que se cruzam comigo. Ou nada.

Algumas vezes, dou por mim calado, rádio desligado, embalado pelos ruídos produzidos pelo carro: motor a trabalhar, pneus na estrada. Se estiver calor, o barulho do vento a assobiar nas janelas. Outro assobio: o das cigarras no Verão e a sombra das árvores projectada na estrada. Se chover, o vai-vem das escovas do pára-brisas. O cheiro da terra molhada. O impacto das gotas no carro. A água que se levanta da estrada quando cortada pelas rodas de um camião ou de um carro mais veloz. A condensação que se forma nos vidros que obriga a ligar a ventilação para desembaciar. Se for de dia, procuro ver a paisagem. Se for de noite, procuro primeiro a lua, depois as estrelas.

Cuidado com bichos que se atravessam na estrada!
Cuidado com os buracos!
Cuidado contigo que há quem te ame e prefira ter-te inteiro. Numa peça só.

E pronto, já estou  outra vez a pensar em ti. Porque, comece onde começar, invariavelmente mais cedo do que tarde, és tu que me livras da tarefa de contar postes ou traços ou carros. Que me salva da entediante tarefa de contar os quilómetros e de ver pela enésima vez a informação do computador de bordo. Que me tira do silêncio de vozes com um toque de telefone ou uma mensagem. Que me leva a empregar mais força na perna direita para que o tempo entre estar contigo seja menor. Que me faz pensar que temos de estar sempre preparados para o que a vida nos tem para oferecer. Se é bom ou mau, depois se verá. Nada de juízos precipitados.

2 comentários: